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Incidência ou não sobre IR por ganho de capital em imóvel doado

O tema de hoje trata sobre a incidência ou não sobre IR por ganho de capital em imóvel doado.


Esse tema sempre volta à tona nas questões relativas à inventário, apesar do caso concreto ter tratado sobre a doação em adiantamento de legítima. É certo que o assunto está longe de estar pacífico ou estabilizado, mas o precedente é importante para resguardar os direitos dos cidadãos, especialmente quanto à bitributação.


Particularmente já tive várias e várias discussões com advogados, contadores e familiares (inclusive os meus), sobre essa temática, e, pelo menos nesse acórdão inovador, o STF parece ter se alinhado com minha visão sobre a questão.


No contexto da antecipação de legítima, a vedação à bitributação é particularmente relevante. A antecipação de legítima é um mecanismo pelo qual o doador transfere bens aos herdeiros ou legatários em vida, antecipando-se à partilha que ocorreria com seu falecimento. A legislação brasileira prevê a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre essas transmissões. Portanto, a incidência do Imposto de Renda sobre o mesmo ato configuraria uma bitributação, visto que ambos os tributos incidiriam sobre o mesmo fato gerador: a transferência de bens.


A decisão analisada pelo STF reitera a importância de se observar os princípios constitucionais tributários, especialmente o da capacidade contributiva e a vedação à bitributação, no contexto da antecipação de legítima. A antecipação de legítima, prática comum no direito sucessório brasileiro, consiste na transferência de bens do patrimônio do doador aos herdeiros ou legatários em vida, antecipando-se à partilha que ocorreria com o falecimento.


O entendimento do STF, ao negar a incidência do imposto de renda sobre o ganho de capital nessa operação, baseia-se na constatação de que não há acréscimo patrimonial disponível ao doador, uma vez que a transferência dos bens não resulta em ganho, mas sim em uma antecipação daquilo que seria devido aos herdeiros ou legatários por direito sucessório.


Ademais, a decisão destaca a importância de se evitar a bitributação, considerando que a incidência do imposto de renda sobre a antecipação de legítima resultaria em uma dupla tributação sobre o mesmo fato gerador, uma vez que o ITCMD já incide sobre a transmissão de bens por doação ou causa mortis.


Vejamos a ementa:


ARE 1387761 AgR / ES - ESPÍRITO SANTO

AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO

Julgamento: 22/02/2023

Publicação: 01/03/2023

Órgão julgador: Primeira Turma

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Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 28-02-2023 PUBLIC 01-03-2023

Partes

AGTE.(S) : UNIÃO ADV.(A/S) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL AGDO.(A/S) : MARIA MAGDALENA RENOLDI MURAD ADV.(A/S) : CRISTIANE MENDONCA

Ementa


Ementa: Direito tributário. Agravo interno em recurso extraordinário com agravo. Imposto sobre a renda. Ganho de capital. Antecipação de legítima. Ausência de acréscimo patrimonial. Vedação à bitributação.


1. Agravo interno contra decisão monocrática que negou seguimento a recurso extraordinário com agravo interposto em face de acórdão que afastara a incidência do imposto de renda sobre o ganho de capital apurado por ocasião da antecipação de legítima (Lei n° 7.713/1988, art. 3º, § 3º; e Lei nº 9.532/1997, art. 23, § 1º e § 2º, II).


2. Esta Corte possui entendimento de que o imposto sobre a renda incide sobre o acréscimo patrimonial disponível econômica ou juridicamente (RE 172.058, Rel. Min. Marco Aurélio). Na antecipação de legítima, não há, pelo doador, acréscimo patrimonial disponível. Acórdão alinhado à jurisprudência desta Corte.


3. O constituinte repartiu o poder de tributar entre os entes federados, introduzindo regras constitucionais, que, sobretudo no que toca aos impostos, predeterminam as materialidades tributárias. Esse modelo visa a impedir que uma mesma materialidade venha a concentrar mais de uma incidência de impostos de um mesmo ente (vedação ao bis in idem) ou de entes diversos (vedação à bitributação). Princípio da capacidade contributiva.


4. Admitir a incidência do imposto sobre a renda acabaria por acarretar indevida bitributação em relação ao imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD). 5. Agravo interno a que se nega provimento.



  • Abaixo o inteiro teor da decisão:



Veja a falta de estabilidade nas decisões e a necessidade de uniformização sobre a incidência ou não sobre IR por ganho de capital em imóvel doado:


"Até o momento, a 1ª e a 2ª Turmas do STF proferiram, cada uma, dois acórdãos com relação ao tema, em sentidos opostos. Segundo afirmam os advogados, o ideal seria a Corte afetar o tema para julgamento em repercussão geral, dando uma orientação para o Judiciário.


Em nota ao Valor Econômico, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirma que como existem precedentes das duas turmas do STF chancelando a exigência do IR “seria possível a submissão da matéria ao Plenário Virtual de repercussão geral, para reafirmação da jurisprudência”.


No mês de agosto, em julgamento virtual, a 1ª Turma deu sinal verde para a União exigir o IR. Reformou acórdão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 6ª Região, o qual havia reconhecido a bitributação.


Conforme diz o relator, ministro Luiz Fux, os fatos geradores dos impostos e as bases de cálculo são distintos. 


“No IRPF, há incidência sobre o patrimônio acrescido referente ao ganho de capital dos ativos herdados. Quanto ao ITCMD, a incidência se dará sobre a transmissão causa mortis da propriedade”, afirma no voto.


Ainda para o ministro, a base de cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) é o acréscimo apurado entre o valor de mercado no momento da transmissão da herança e o valor de aquisição do bem, enquanto do ITCMD, é o valor venal do bem transmitido causa mortis.


Neste caso, a decisão foi unânime. Participaram do julgamento a ministra Cármen Lúcia, que tem se posicionado a favor da União na tese, além dos ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Luís Roberto Barroso.


No começo do ano, em fevereiro, o julgamento da mesma questão na 1ª Turma teve, porém, desfecho diferente. A maioria dos ministros impediram a exigência do IR por entender estar configurada a bitributação, mantendo a decisão do TRF da 2ª Região, favorável ao contribuinte.


No julgamento, Barroso fundamentou que o Supremo tem entendimento de que o IR incide sobre acréscimo patrimonial disponível econômica ou juridicamente, além de que a Constituição repartiu o poder de tributar entre os entes federados.


“Admitir a incidência do imposto sobre a renda nos moldes defendidos pela Fazenda acabaria por acarretar indevida bitributação, na medida em que também incidiria o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação”, afirma o ministro no voto.

Na ocasião, acompanharam o relator os ministros Luiz Fux, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli. Apenas a ministra Cármen Lúcia divergiu.


Neste ano de 2023, a composição das turmas do STF mudou. Em maio, o ministro Toffoli passou da 1ª para a 2ª Turma. Em agosto, o novo ministro Cristiano Zanin passou a compor a 1ª Turma.


Vale ainda dizer que na 2ª Turma também não há entendimento uniforme. No início de março, os ministros não entraram no mérito da discussão. Assim, por unanimidade, entenderam que não haveria, no caso, discussão constitucional para a Corte analisar.


Mantiveram assim, na prática, a decisão do TRF da 1ª Região que, além de reconhecer a bitributação, entendeu não ter ocorrido ganho de capital na transferência do bem herdado.


“Eventual discussão acerca da ocorrência de bitributação, nas hipóteses de incidência do IR sobre imóveis recebidos em herança, exigiria a reinterpretação de norma infraconstitucional (Lei nº 9.532), o que é vedado em sede de recurso extraordinário, além de revelar afronta meramente reflexa ou indireta ao texto constitucional”, afirmou o relator, ministro Nunes Marques.


A 2ª Turma, em fevereiro de 2021, por unanimidade, havia liberado a União de exigir o IR, a partir do voto da relatora, ministra Cármen Lúcia. Na época, ela compunha o colegiado. 

Conforme o entendimento de Lúcia, as normas que prevêem a tributação não inovam sobre o fato gerador do IR, até mesmo na determinação de incidência desse tributo sobre a doação ou a herança.


“Trata-se apenas da definição do momento para a apuração do ganho de capital tributável”, diz ela.


A ministra ainda acrescenta que também não haveria bitributação, uma vez que o IR recai sobre o ganho de capital apurado na doação em antecipação de herança, e não sobre a doação em si.


Em abril de 2023, essa foi a mesma linha adotada pelo ministro Gilmar Mendes, em decisão individual. Conforme ele, o parágrafo 1º do artigo 23 da Lei nº 9.532, de 1997, apenas explicitou o momento de apuração do acréscimo patrimonial, o qual não tratou de inovação sobre o fato gerador do IR.


“A tributação do ganho de capital nas transferências de bens do de cujus ou do doador configura acréscimo patrimonial sujeito à incidência do Imposto de Renda, não se havendo cogitar de bitributação ou de invasão de competência tributária”, afirma."







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